AFECTOS
O ódio, emoção negativa. 01.
«O ódio é um sentimento negativo que nada cria e tudo esteriliza: - e, quem a ele se abandona, bem depressa vê consumidas na inércia as forças e as faculdades que a Natureza lhe dera para a acção. O ódio, quando impotente, não tendo outro objecto directo, nem outra esperança senão o seu próprio desenvolvimento - é uma forma da ociosidade. É uma ociosidade sinistra, lívida, que se encolhe a um canto, na treva.». (19, p. 77) (1)
Raiva "misturada" com medo em gravura do século XVIII. |
Na verdade, bem mais interessante, do ponto de vista que nos interessa agora, é dizer qualquer coisa sobre a experiência da emoção do ódio e sobre a pedagogia de lidar com ele, a qual pede, tantas vezes, que das tripas se faça coração.
Eça de Queirós é autor do texto de que extraímos este excerto sob o nome João Gomes. O texto foi publicado na Revista Portugal, em Fevereiro de 1890, e tem a ver com o ultimato inglês, fresquinho, entregue oficialmente a Portugal em 11 de Janeiro deste ano. Portugal vive muito a quente a ameaça da velha aliada europeia. Talvez por isso Eça matize a caracterização do ódio com a condicionante "quando impotente" (*).
Ora, o que é verdadeiramente impressionante é encontrar um paralelismo entre o modo como o escritor fala do ódio e o modo como Darwin fala das emoções negativas, mesmo nos últimos parágrafos do seu notável livro sobre a expressão das emoções, que foi publicado em 1872:
«O facto de exprimirmos uma emoção através de sinais exteriores faz com que ela seja intensificada. A repressão, pelo contrário, de todos os sinais exteriores da emoção, na medida em que é possível, conduz a um atenuamento da mesma. Uma pessoa que não refreie os gestos violentos quando está furiosa, acaba por aumentar a sua fúria; quem não controla os sinais do medo, irá sentir ainda mais esse medo; e alguém que permanece passivo quando é esmagado pela dor, perde com isso a sua principal hipótese de recuperar a elasticidade mental.» (2)
Palavras-chave: ódio, ociosidade, emoções, fúria, medo, dor, elasticidade mental
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(*) No mesmo texto, poucas linhas antes, Eça escreve: «O ódio pode formar um factor na vida de um povo quando apaixonadamente incite e aqueça a actividade que prepara a desforra. Ora a desforra consiste em derrotar quem nos derrotou, humilhar quem nos humilhou».
(*) No mesmo texto, poucas linhas antes, Eça escreve: «O ódio pode formar um factor na vida de um povo quando apaixonadamente incite e aqueça a actividade que prepara a desforra. Ora a desforra consiste em derrotar quem nos derrotou, humilhar quem nos humilhou».
(1) 19 – Reis, C. (coord.). Edição Crítica das Obras de Eça de Queirós, Textos de Imprensa VI (da
Revista de Portugal). Lisboa, INCM, 1995, p. 77)
(2) Darwin, C. A Expressão das Emoções no Homem e nos Animais, Lisboa, Relógio d' Água, 2006, p. 336
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